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Saúde mental LGBTQIA+: vão os armários ficam os cabides

  • Foto do escritor: Rafa Vicente
    Rafa Vicente
  • 20 de dez. de 2022
  • 4 min de leitura

Atualizado: 25 de set. de 2024

Aviso: esse texto é a abertura de um diálogo para troca, reconhecimento e para compartilhar a jornada. Não é um estudo absoluto sobre o tema.

"Eu não mereço tanto!"

"Nossa muitoooooo obrigado pela oportunidade."

"Imagina, não precisa agradecer, é o meu dever!"


Neste ano reparei que repeti essas frases milhares de vezes ao longo da minha vida, para as pessoas e para mim mesmo. E que não só falei como senti que não merecia as coisas boas que conquistei, que deveria ter gratidão eterna ao ganhar alguma oportunidade, que era o meu dever estar disponível para as demais pessoas.


O saldo disso foi parecer que todas as vitórias e momentos bons que tive até aqui foram, na verdade, conquistas de outras pessoas. Para mim sobrava cobrança, o sentimento de estar atrasado e a quebra de expectativa dos outros.


Então, decidi aprofundar e me conhecer melhor. Depois de muitas sessões de terapia e de estudos sobre saúde mental na população LGBTQIA+, comecei a entender que essas frases são cicatrizes que muitas pessoas compartilham.


Por isso, quis escrever esse texto com um pouco dos principais termos e experiências que me ajudaram a desvendar um pouco mais a origem dessas cicatrizes. Vou compartilhar com vocês os seguintes pontos:

  • a homofobia internalizada,

  • a síndrome do bom menino,

  • o controle excessivo.


A imagem mostra uma ilustração de uma criança vista de costas, vestindo uma camiseta listrada de preto e branco. A criança está abrindo uma porta ou janela estreita, olhando para fora. O fundo é escuro, criando um contraste que destaca a figura da criança e o ato de explorar o ambiente externo. A ilustração transmite uma sensação de curiosidade e descoberta.

A primeira coisa que precisamos estabelecer é que vivemos em uma sociedade estruturalmente LGBTfóbica, ou seja, constantemente é reforçado na televisão, no entretenimento, nas famílias e nas outras instituições que ser LGBTQIA+ é errado e fora do padrão (heterocisnormativo).


“A homofobia é composta de alguns elementos, tais como: machismo, heteronormatividade, heterossexismo e misoginia.”

Pedro Paulo Sammarco Antunes

Psicólogo


Esses reforços são internalizados pelas pessoas LGBTQIA+, gerando sentimentos de culpa e vergonha por ser quem se é. Essa é a homofobia internalizada, na qual a pessoa vai tentar corrigir, isolar ou eliminar a homossexualidade dentro de si. Por consequência, a pessoa tem dificuldade em amar quem ela é e acaba criando mecanismos para combater os seus sentimentos e desejos, o que pode gerar muito sofrimento e o apagamento da espontaneidade.


“Em contraste com a hostilidade que heterossexuais dirigem aos homossexuais, chamada de homofobia institucionalizada por Maylon apud Herek (2004), a homofobia internalizada implica um conflito psíquico entre o que as pessoas pensam que deveriam ser (heterossexuais) e como eles experimentam sua própria sexualidade (como homossexuais ou bissexuais). Segundo Weinberg (1972), no caso da homofobia internalizada, a melhor resolução para o indivíduo de fato parece ser a de "libertar o homossexual" de dentro de si mesmo, ao invés dereprimí-lo. Porém, por causa do preconceito ainda existente, isso não é um processo fácil para muitos homossexuais.”

Pedro Paulo Sammarco Antunes

Psicólogo


Uma estratégia que eu me apropriei, e que não sabia o nome, é a síndrome do bom menino. O contexto é o seguinte: você é criança; percebe que tem algo diferente entre você e outras crianças parecidas contigo; ouve piadas ou sofre alguma violência por conta disso; se entende como “quebrado/a/e”; busca uma alternativa para pertencer e parar de sofrer.


Dentre as opções você pode se revoltar contra o que está vivendo, o que leva ao confronto direto, ou se reprimir para tentar agradar as pessoas. Na maioria das vezes se escolhe reprimir os seus sentimentos e engolir a seco todas as dúvidas que tem sobre você. Eu sempre fui uma criança viada, não tinha como negar, e a estratégia mais “fácil” para não ser atacado era agradar a todos e usar do humor para ser acolhido.


Com o passar do tempo, o efeito colateral é colocar os demais sempre à frente de você, vestir todas as expectativas explícitas ou veladas que as pessoas têm e tentar agradar performando esse papel à exaustão até parar de ouvir os seus sentimentos.


Quando criança, essa é uma estratégia de sobrevivência necessária, embora não evite as violências. Porém, com o tempo, não se encontra mais refúgio nesse recurso, toda essa repressão não compensa os segundos de pertencimento, além de causar uma série de traumas e sofrimentos.


Para manter as aparências e tentar “consertar” o que parece “quebrado” é preciso muito controle, atuação e obediência. Ser a criança, o adolecente e o adulto que “não dá trabalho”, que é bondoso, que vai super bem na escola, na faculdade, no trabalho, que ajuda em casa, que agrada a todos e que não se revolta.


Com isso, também, somos impelidos a tentar ser “a pessoa perfeita” e o mais próximo da heterossexualidade possível, pois isso parece “compensar” a risada alta, o jeito de caminhar, de falar, de sentar, a forma como se veste e por quem sente atração. Você começa a parar de ouvir as críticas ao seu jeito de ser para ouvir os elogios dessa “pessoa perfeita”.


A consequência desse controle excessivo é a autocrítica, que eleva todas as réguas, fazendo com que pequenos contratempos se tornem enormes momentos de depreciação e dor. E aquela vozinha, que questiona nossa capacidade e merecimento, vem com tudo..


Junto, no combo, temos a hipervigilância, já que ninguém pode perceber que você não é essa pessoa ideal e que é tudo uma performance. Esses fatores sufocam a autenticidade das pessoas LGBTQIA+. Você para de entender se é você mesmo que gosta de determinada coisa ou se é o seu alter ego “perfeito”.


“Criticamos nossa forma de ser, se portar e expressar pois foram alvo de críticas durante toda nossa vida. Tudo isso resulta numa hipervigilância constante, em que desaprovamos quem somos e nos moldamos ao heteronormativo.”

João Brod Jacobs

Psicólogo


Bom, não é fácil esse processo de autoconhecimento, mas é muito libertador. Dar nome aos meus sentimentos e sofrimento, buscando dentro de mim a autenticidade está sendo um caminho para fazer as pazes comigo.


Conforme for evoluindo nessas questões, venho compartilhar com você. Mas, como falei, esse texto é um diálogo, então fique a vontade para continuar essa conversa.



Algumas referências que vem me ajudando:

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